domingo, agosto 22, 2010

Mais pesado que o céu

Seus pais não eram como ele. Aliás, ninguém era. Ninguém o compreendia, muito menos entendiam sua mente cheia de devaneios, desejos e um incontrolável anseio de mudar. O mundo? Não, o mundo era muito para ele, pois não o conhecia. Desde criança queria algo pra si mesmo, algo que poderia chamar de seu, apenas seu.
Assistiu com pesar o divórcio de seus pais, aos 8 anos e, desde então, sua vida tornou-se um tornado eterno. Sorrir era algo muito presunçoso para seu tipo sombrio, queria manter-se oculto e o rosto melancólico e fechado tornou-se uma máscara para que ninguém possa reconhecê-lo. Mas a máscara não mudou, e sua face tornou-se conhecida.
Ainda jovem, conheceu um rapaz que lhe ajudou muito a tentar entender a si mesmo. Foi morar junto com ele, já que não tinha mais casa fixa. Os pais do rapaz eram extremamente religiosos, e o jovem conheceu um ser grandioso, piedoso e amoroso. Encantou-se de início, mas acabou conhecendo outras crenças orientais, que lhe surpreenderam, pela medida da compatibilidade com seus desejos. Libertar-se da dor e do sofrimento mundanos, elevar-se a um plano superior. Essas ideias levaram-lhe a dar asas ao seu ser artístico.
Mantinha seu diário sempre ao seu lado, com suas caprichadas caricaturas de personagens famosos da época e seus poemas. Frases revoltadas ecoavam em cada página, até que, por um desentendimento entre ele e seus pais, acabou expulso de ambas as casas, e passou a procurar abrigo nas casas dos amigos e até passou alguns dias debaixo de uma ponte. Mas sua sorte tendia a mudar.
Conheceu amigos que levaram-lhe a vários lugares e que mudaram seu pensamento. Não se importava mais com os estereótipos da sociedade e, mesmo que raramente, esboçava um sorriso. Era apaixonado pela arte em si, mas mantinha um relacionamento íntimo com a música. Desde criança já apresentava dons vocais e instrumentais. Foi quando estes novos amigos levaram-lhe aos concertos. E apaixonou-se, e idealizou, e juntou a fome com a vontade de comer. Juntou dois de seus melhores companheiros e, juntos, disseminaram a arte, a revolta, o utópico mudar, a elevação e o refúgio. E voltara a não sorrir, mas apenas externamente, como uma forma de demonstrar seriedade.
Mas o reconhecimento por sua máscara acabou por destrui-lo. Muitas pessoas apreciavam sua verdadeira poesia, mesmo quando não entendiam o propósito. E lhe enraivecia quando as pessoas não entendiam seu propósito. A raiva era tanta que precisava acalma-la, cessa-la, controla-la. Aprendeu o lado mau da humanidade, conheceu as armas e os narcóticos e, com isso, tornou-se figura de desejo dos policiais. Mas não queria se entregar à loucura, não queria ser conhecido assim. Agora que o mundo estava prestes a conhece-lo, não queria perder sua tão merecida conquista, seu espírito merecia paz.
A paz, que sim, poderia ser só sua, o sonho de toda a sua vida, poderia ser alcançada, se unisse tudo o que lhe fazia escuro e sombrio e, repentinamente, cortasse. Fez seu máximo esforço para sorrir enquanto um grande público o observava, mas tinha esquecido como sorrir. Assumiu que o melhor a fazer era garantir sua paz antes que esquecesse também como amar. E conseguiu, de modo egoísta e solitário, sua elevação, sua libertação, seu nirvana máximo.

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